A expansão mercantil europeia

  1. A transição do feudalismo para o capitalismo

O período da expansão mercantil europeia, nos séculos XV e XVI, é conhecido como as Grandes Navegações e Descobrimentos. Esse tempo foi caracterizado pela transição do feudalismo para o capitalismo. Durante essa passagem da Idade Média para a Idade Moderna, o sistema feudal enfrentava uma crise. Ao mesmo tempo, surgiam os primeiros sinais do capitalismo, que ainda estava em sua forma inicial, denominada pré-capitalismo. Embora o capitalismo tenha se consolidado plenamente apenas com a Revolução Industrial, muitos de seus elementos essenciais já estavam presentes nesse período. Esses elementos incluíam a produção voltada para o mercado, as trocas monetárias, a busca pelo lucro e as atividades financeiras típicas do capitalismo moderno.

 

Politicamente, essa época representou a fase final do surgimento das Monarquias Nacionais, que levariam à formação do Estado Moderno. O processo de centralização política culminou no absolutismo monárquico. No plano social, observava-se a lenta ascensão da burguesia, uma nova classe social intimamente ligada ao capitalismo em desenvolvimento. Outro aspecto relevante foi o aumento da urbanização, impulsionado pela expansão mercantil nos séculos finais da Idade Média. No campo cultural e religioso, ocorreram importantes transformações. Culturalmente, o Renascimento marcou uma renovação intelectual, representando a transição do teocentrismo religioso para o antropocentrismo, mais focado nos interesses humanos e materiais. Na esfera religiosa, a unidade cristã foi abalada pelas Reformas Religiosas, das quais emergiu a ética protestante, fortemente associada ao espírito de acumulação capitalista.

  1. O comércio e as crises da Baixa Idade Média

Cenário Econômico Pré-Expansão

Para entender melhor o processo de expansão ultramarina europeia, iniciado no século XV, é necessário compreender o cenário econômico da Europa nos dois séculos que antecederam as Grandes Navegações. No século XIII, impulsionada pelo Renascimento Comercial e Urbano, que teve início com as Cruzadas, houve uma intensa atividade mercantil. Essa economia, cada vez mais baseada em transações monetárias, estabeleceu fortes laços comerciais com o Oriente, tendo o Mar Mediterrâneo como o principal eixo. Naquela época, o Mediterrâneo se tornou quase um “lago italiano”, com mercadores italianos alcançando os pontos mais distantes de comércio, desde o Mar Negro e o Egeu até o Estreito de Gibraltar.

Essa situação conferiu grande importância às cidades italianas, como Veneza e Gênova, pois seus comerciantes controlavam os principais entrepostos comerciais no leste do Mediterrâneo, incluindo Alexandria, Antióquia, Beirute e, acima de tudo, Constantinopla, a capital do Império Bizantino, que era um grande centro comercial desde a Antiguidade. Ao mesmo tempo, ao norte da Europa, os Mares Báltico e do Norte também eram cenários de intenso comércio. Além disso, em terra, rotas mercantis atravessavam o continente em várias direções, com feiras comerciais muito frequentadas. Em suma, as cidades europeias cresciam, especializando-se na produção voltada para o mercado e nas atividades comerciais.

Crises do Século XIV

No século XIV, esse cenário mudou drasticamente. A Europa foi devastada por uma série de crises, incluindo fome, pestes e guerras, que refletiam a crise geral do feudalismo. Nesse contexto, ocorreram rebeliões camponesas, como as Jacqueries na França, e revoltas de artesãos nos principais centros manufatureiros da época. Essa crise não apenas abalou a economia feudal, que era essencialmente agrária e já estava em declínio, mas também afetou o comércio mediterrâneo, que, por sua vez, passou por um período de grande estagnação até o início do século XV. No início deste século, a situação do comércio e da burguesia europeia era grave. Portanto, tornou-se crucial a reativação das rotas comerciais com o Oriente, considerada a única saída para recuperar a economia mercantil e monetária em colapso.

portugueses na costa africana - grandes navegações

 

  1. Fatores do expansionismo mercantil europeu

A expansão mercantil europeia, que marca o começo da Era Moderna, foi consequência de uma série de transformações e demandas que caracterizaram o fim da Idade Média na Europa. Esse processo envolveu uma combinação de fatores econômicos, políticos, sociais, culturais e religiosos, conforme descritos a seguir.

Econômicos

No aspecto econômico, a Expansão Marítima foi uma solução para as crises que atingiram a Europa nos séculos XIV e XV. A recuperação dependia da retomada do comércio lucrativo com o Oriente, onde produtos de alto valor, como sedas, musselinas, tapeçarias, objetos de marfim, joias e especiarias (como cravo, pimenta, canela, noz-moscada e açúcar), eram muito procurados. Para facilitar essa retomada, era essencial conquistar novos mercados e descobrir rotas marítimas para as chamadas “Índias”, termo que se referia ao Oriente.

Inicialmente, essas novas rotas foram estabelecidas nos centros comerciais do norte da África e ao longo da costa atlântica africana. A busca por novas rotas tornou-se necessária, pois os comerciantes árabes controlavam os mercados do Oriente Médio, Índia, China, Japão e outras regiões da Ásia. Além disso, as cidades italianas monopolizavam as rotas do Mediterrâneo. Por fim, havia uma alta demanda por metais preciosos, que eram essenciais para a cunhagem de moedas. Esses metais eram escassos na Europa, mas fundamentais para revitalizar o próspero comércio oriental.

Políticos

Dentre os fatores políticos, destaca-se a concentração de poder nas mãos dos reis, marcando a formação das monarquias nacionais europeias. Somente um Estado com poder centralizado poderia, do ponto de vista econômico e administrativo, planejar e executar a expansão. Outro fator político, relacionado a esse contexto, foi a aliança entre os monarcas europeus e a burguesia mercantil, que, apesar de rica, dependia enormemente das ações do Estado. Este era o único capaz de mobilizar recursos materiais e humanos em escala nacional e, ao mesmo tempo, implementar medidas protecionistas para sua atividade econômica.

Sociais

No aspecto social, observa-se a ascensão da burguesia e o aumento da urbanização, que influenciavam diretamente o crescimento do consumo de produtos orientais. Isso resultou em mudanças significativas nos hábitos e costumes da população das cidades europeias daquela época.

Culturais

Culturalmente, observamos a influência dos princípios filosóficos do humanismo renascentista, que incentivou uma maior valorização do conhecimento sobre o ser humano e seu entorno. Além disso, a Renascença teve um papel fundamental no avanço das navegações, melhorando e refinando conhecimentos técnicos, como os instrumentos de navegação (bússola e astrolábio), a construção naval (com inovações nas embarcações, como as naus e caravelas) e promovendo o desenvolvimento das ciências e estudos que transformaram a arte náutica, incluindo a Geografia, a Cartografia, a Física e a Astronomia, entre outras.

Religiosos

No campo religioso, o movimento expansionista apareceu como uma grande cruzada. O ideal cruzadista, no entanto, serviu como justificativa para as expedições ultramarinas. A Igreja Católica e a nobreza feudal apoiaram essa ideia. Essa justificativa se relacionou diretamente com a luta contra o mundo muçulmano. Assim, buscou-se expandir a fé cristã. Além disso, havia o interesse em conquistar terras árabes e obter riquezas dos derrotados. Tudo isso se apresentava sob a perspectiva de uma Guerra Santa.

 

Por conta desses fatores, o processo das Grandes Navegações tomou três direções complementares. Primeiramente, ocorreu a exploração comercial da costa norte e atlântica da África, iniciada por Portugal no século XV. Em segundo lugar, Portugal e Espanha descobriram, conquistaram e colonizaram a América, principalmente no século XVI. Por último, o mesmo século viu a formação do Império Português no Oriente (Índias), que estabeleceu uma nova rota comercial com essa região.

 

Quadro Esquemático – A transição do feudalismo para o capitalismo no contexto da expansão mercantil

 

 

Tabela 1 – Características do feudalismo, capitalismo e transição na expansão mercantil

Fonte: Elaboração própria

 

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